Carta aberta à bombeira que morreu nos incêndios em Tábua está a emocionar a todos –
O drama dos incêndios voltou a assolar Portugal, com muita área florestal ardida e, pior do que tudo, nove vidas humanas que se perderam. Entre as vítimas mortais, há quatro bombeiros que perderam a vida no exercício das suas nobres funções, três deles combatiam juntos em Tábua.
E é sobre Sónia, uma jovem bombeira, que era enfermeira e estava noiva, que Luís Osório escreveu. Um texto sobre Sónia, sobre os bombeiros e que está a emocionar a todos:
Podia falar da história de cada um deles, de cada uma das vidas travadas, dos sonhos que tinham por cumprir, das infâncias difíceis, felizes, inquietas ou pacificadas.
Podia fazê-lo, mas não consigo deixar de ver os olhos tão cheios de futuro de Sónia Melo.
Não consigo deixar de olhar a fotografia em que sorri para a vida, para nós também agora que a conhecemos sabendo que nunca mais a poderemos ver.
2. A Sónia tinha 36 anos.
E os amigos juravam que àquela miúda nada poderia acontecer. Era a melhor de todos, a mais generosa, a que se sacrificava pelos outros.
Uma pessoa assim tão boa estava imune a qualquer desgraça, os poderes daqui e do outro lado não deixariam que acontecesse, morreria certamente velhinha e sem dívidas aos sonhos.
Teria continuado a ser bombeira voluntária em Vila Nova de Oliveirinha – como poderia deixar de o ser se os bombeiros existem para estar na primeira linha?
Como poderia deixar de ser bombeira se foi ali que conheceu o amor da sua vida; as amigas até gozavam um bocadinho o prato, o Francisco tinha pouco mais de vinte anos, era um menino com menos dez do que ela.
Mas o amor é isto, não escolhe o lugar e a idade, é o que é.
Apaixonaram-se há três anos e o casamento estava marcado para o 28 de julho do próximo ano. Já havia uma lista de convidados e até tinham combinado surpresas nas férias em Cabo Verde.
3. Sabia lá a Sónia que seria a sua última viagem, as suas últimas férias, os seus últimos planos e sorrisos?
Chegou de Cabo Verde e começaram os fogos. E ela lá foi.
Pediu para lhe serem alterados os turnos de enfermeira nos dois sítios onde trabalhava e foi apagar fogos.
Peço-te desculpa a ti que me lês, que me ouves todos os dias…
… pelo também desculpa à memória dos outros sete que partiram…
… mas este Postal é para ela, para aquele sorriso de menina feliz e generosa, para a Sónia que era amada pelas pessoas, a que toda a gente acreditava ser indestrutível por ser tão boa, por ter um coração tão grande.
Não voltará a apagar incêndios ou a vestir a bata de enfermeira, não terá os filhos que ambicionava, não será mãe, avó.
O namorado Francisco, que sobreviveu às chamas e lhe pressentiu a morte ao longe, jamais a esquecerá.